“Você não vai querer sangue ruim no seu corpo, né? Não vai querer sangue de gente promíscua?”
“Você está insinuando que eu sou promíscuo?”
“Não.”
“Você está insinuando que os gays são promíscuos?”
“Veja bem, o que eu
quis dizer é que você é uma exceção, né. É difícil ver gays em
relacionamentos estáveis como o que você está relatando para mim.”
Esse foi o diálogo que Leonardo Uller
teve com a médica Mirianceli Mendonça (CRM 55924-SP) ao tentar doar seu
sangue no Hospital 9 de Julho, em São Paulo.
O estudante de jornalismo de 19 anos respondeu ao questionário do
hospital antes da doação e confirmou que era homossexual, mas que
mantinha um relacionamento fixo há mais de 12 meses e que sempre usou
preservativo. Ainda assim, a médica afirmou que não poderia doar seu
sangue porque era considerado “de risco”.
Leonardo manteve a discussão mesmo após sofrer assédio moral e
conseguiu realizar a doação. Entretanto, a pior notícia veio depois:
seu sangue seria descartado. Uma colega próxima do estudante conversou
com os diretores do Hospital 9 de Julho, que informou: “O hospital, que
tem obrigação em preservar a saúde e vida dos pacientes, nunca será
condenado por se tratar de pessoas de alto risco e contágio”. “A bolsa
do sangue doado é descartada”, contou em uma conversa informal via
Facebook.
O jovem relatou que já doou sangue
outras vezes no Hospital São Paulo, e que nessa instituição nunca
perguntaram sobre a sua sexualidade. “A pergunta é apenas quantos
‘parceiros’ nos últimos 12 meses, sem especificar o sexo”, disse
Leonardo. Porém, desta vez precisava ajudar a repor as doações do
Hospital 9 de Julho, onde seu tio está internado.
“Hoje eu entrei em contato com a
Defensoria Pública e, por conta da falta de testemunhas, eles falaram
que talvez a melhor opção seja apenas um ofício para notificar o
hospital”, contou Leonardo. Mesmo assim, ele mantém a intenção de
processar a instituição e para isso já conta com
auxílio de um advogado. “A maior prova que eu tenho é o próprio sistema
do hospital e a minha ficha, onde tem o questionamento se ‘tive
relações com outro homem’”.
Em um relatório enviado à instituição, o jovem questiona: “Sobram tantos doadores no Hospital 9 de Julho para jogar
o meu pelo ralo?”.
Ele também enviou a Portaria Nº 1353 de 13/06/2011 do Ministério da
Saúde, cujo artigo 1º § 5º define: “A orientação sexual
(heterossexualidade, bissexualidade, homossexualidade) não deve ser
usada como critério para seleção de doadores de sangue, por não constituir risco em si própria”.
Apesar de
contar com o apoio de grupos estudantis, Leonardo espera agora a
manifestação de lideranças LGBT sobre o assunto. “Mandei uma mensagem
pro [deputado federal] Jean Wyllys, mas até agora nada”, disse ele, que
considera o fato homofobia.
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